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Livro reúne 100 discos que marcaram os últimos 100 anos na América Latina

Waldenyr Caldas, professor sênior da ECA, foi curador ao lado de outros estudiosos e artistas

Comunidade

Em 12 de dezembro, o Memorial da América Latina lançou o livro Latinidades: 100 anos em 100 discos, obra que destaca marcos do cenário musical do continente entre 1922 e 2022. Dentre os pesquisadores envolvidos no projeto, esteve Waldenyr Caldas, professor sênior do Departamento de Comunicações e Artes (CCA) e diretor da ECA de 2001 a 2005.

Arte digital de divulgação do livro. A imagem emula uma foto de um disco de vinil, com o rótulo no centro da imagem, cercada pela borda preta onde as músicas estão gravadas.  O rótulo  leva o título da obra, os nomes dos curadores e os logos do Memorial da América Latina e do Governo do Estado de São Paulo em letras brancas sobre um fundo vermelho escuro.
Imagem: Reprodução/Memorial da América Latina

O convite para participar deste trabalho veio de Fabrício Raveli, diretor de atividades culturais do Memorial da América Latina, ainda durante a pandemia. O docente e outros quatro especialistas responsáveis pela curadoria se reuniram virtualmente para discutir ideias e sugestões que proporcionassem ao livro unidade e coesão. “Após estabelecermos os critérios de criação e produção do livro, cada um de nós passaria a trabalhar isoladamente, mas sempre mantendo contato online”, conta Waldenyr. Cada curador se dedicou à análise de um período de 20 anos: 

  • 1922-1941: Waldenyr Caldas, doutor em Sociologia pela USP, professor sênior do CCA e ex-diretor da ECA;

  • 1942-1961: Juca Novaes, cantor, compositor, produtor e advogado especializado em direitos autorais;

  • 1962-1981: Willy Verdaguer, maestro, diretor musical, baixista, ex-membro dos grupos Secos & Molhados e Beat Boys e fundador do grupo Raíces de América;

  • 1982-2001: João Barone, baterista e co-fundador da banda Os Paralamas do Sucesso;

  • 2002-2022: Felipe Machado, escritor, jornalista e editor de cultura da revista IstoÉ.

Apesar da diferença de gerações entre os autores, o docente acredita que o livro possui “uma boa coerência de resultados e um conteúdo muito consistente”. Por haver afinidades nos campos de conhecimento e de interesse de todos, as distinções se diluíram e não interferiram no trabalho que, segundo o professor, foi muito bem realizado.

 

Antes do LP

Waldenyr conta que ainda não existia o disco Long Play (LP) - apelidado de “bolachão” pelos colecionadores - nos anos entre 1922 e 1941, período que analisou. Essa discrepância tecnológica impactou bastante o estudo, segundo o professor, pois exigiu uma extensa busca por registros de uma época em que a documentação era bastante escassa. Para enfrentar esse desafio, o curador contou com a “inestimável colaboração” de Christiane Wagner, professora convidada no Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP e mestre em Ciências da Comunicação pela ECA.

Foto em preto e branco do rosto de um homem sorrindo. Ele é branco, tem olhos escuros, veste um terno escuro, camisa branca e gravata estampada. Ele olha para o lado e usa um chapéu.
Carlos Gardel (1890-1935). Imagem: Reprodução/Wikimedia Commons

Na curadoria, o docente elencou alguns países para terem sua cultura musical analisada, dentre eles Argentina, Paraguai, Bolívia e Costa Rica. “Escolho duas canções de cada país e faço um comentário mostrando a importância delas, falando do autor e da música”, conta. 

Para decidir quais obras seriam incluídas no projeto, Waldenyr utilizou  o critério da popularidade da composição no período analisado. Na Argentina, por exemplo, um dos músicos escolhidos foi Carlos Gardel, que, apesar de ser uruguaio, ficou conhecido por imortalizar o tango argentino com seu “vozeirão maravilhoso”, de acordo com o professor.

Já entre os artistas brasileiros, estiveram Braguinha - “que foi um dos grandes compositores da música carnavalesca brasileira no tempo em que a festa se dava nos salões, e não nas ruas”, afirma o curador- e Ary Barroso, que compôs  a célebre Aquarela do Brasil. Além destes, Waldenyr destaca o exímio saxofonista Alfredo Vianna, o Pixinguinha, autor do choro Carinhoso

 

Foto em preto e branco do rosto de um homem sorrindo. Ele é negro, tem cabelos escuros e curtos, olhos escuros, veste terno e camisa brancos e uma gravata escura. Ele olha para câmera e segura um saxofone.
Alfredo Vianna, o Pixinguinha (1897-1973). Imagem: Reprodução/Música Brasilis

“[Carinhoso] é uma música que atravessou o tempo, tanto os senhores de 80 anos quanto os jovens de 18 gostam dela. Ela fala de um amor que está nascendo com muita força, virou uma espécie de hino do amor do brasileiro.”

 

Waldenyr Caldas, professor sênior do Departamento de Comunicações e Artes

 

Noel Rosa também foi um dos selecionados pela curadoria. O criador de Com que Roupa? e Fita Amarela é considerado um dos grandes responsáveis pelo pontapé inicial da Música Popular Brasileira, a MPB. O docente explica que, na época, o artista, além de escrever canções muito bonitas, “não foi um cantor-compositor que passou como relâmpago, ele ficou”.
 

Antes das revoluções musicais

Conforme o tempo passou, muitas mudanças ocorreram na cultural musical, como o avanço tecnológico das gravações e dos instrumentos e as técnicas de impostação de voz dos artistas. “Os cantores intérpretes dessa época [entre os anos 1920 e 1940] tinham uma forma grandiloquente de cantar, muito diferente, por exemplo, da forma intimista de João Gilberto e de outros cantores do movimento Bossa Nova surgido na década de 1950”, explica o curador. O movimento representou uma grande revolução estética na Música Popular Brasileira (MPB), tanto na maneira de cantar quanto na forma de arranjar e tocar as  canções. Por conta disso, a história da MPB pode ser dividida em dois grandes momentos: antes e depois da Bossa Nova.

Waldenyr ressalta, contudo, que essas transformações não impediram “que o bolero mexicano, a rumba cubana, o tango argentino, a guarânia paraguaia, entre outros ritmos essencialmente latino americanos, continuassem a sua caminhada de sucessos em nosso país.”

 

Pesquisador da cultura

Estudar sobre música popular não é novidade para Waldenyr. Ele é autor de diversas obras dedicadas a temas como música popular brasileira e cultura, como os livros Iniciação à Música Popular Brasileira e A Cultura Político-Musical Brasileira. O docente relata que o projeto desenvolvido para o Latinidades é fruto da somatória de sua formação acadêmica e novas pesquisas mais específicas que se fizeram necessárias. 

“Foi um trabalho que me fez estudar para reaprender algumas coisas que estavam ‘armazenadas’ em minha cabeça e que foram reavivadas e interpretadas por mim, tendo como ponto de partida os anos de 1920 e 1940, mas também a contemporaneidade”, narra o professor.

O curador ainda conta que o livro carrega uma homenagem a Zuza Homem de Mello, um importante jornalista e musicólogo especializado em MPB. O pesquisador que por vezes se reunia com Waldenyr para conversar e discutir sobre música faleceu em 2020, aos 87 anos.

 

 

 


Imagem de capa: Reprodução/Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais
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