CJE | Departamento de Jornalismo e Editoração



Por que pesquisar o jornalismo especializado?

Autor de tese pioneira sobre jornalismo científico no Brasil cria novo grupo de pesquisa, o JornEsp

 

Estudos

Quando se fala em jornalismo, as imagens que vêm à cabeça da maioria das pessoas se referem a coberturas de guerras ou do mundo político, ou ainda reportagens investigativas, especialmente na televisão. Muita gente não sabe que o trabalho na comunicação interna e externa de empresas é uma frente de atuação importante para jornalistas. E é a esse universo que se dedica o grupo de pesquisa Jornalismo na Comunicação Organizacional (JorCom), criado em 2019 no Departamento de Jornalismo e Editoração (CJE) da ECA e liderado pelo professor sênior Wilson Bueno

O JorCom abrange três linhas de pesquisa principais: o jornalismo como processo estratégico nas empresas e organizações; o jornalismo na formação da imagem e da reputação das empresas e organizações; e a comunicação organizacional e o jornalismo especializado. Dentre os diversos materiais que o grupo produz sobre essas temáticas, estão os e-books disponíveis gratuitamente no site do grupo. Com a expansão de pesquisas relacionadas  ao jornalismo especializado, o JorCom está agora se desdobrando em um novo grupo, o JornEsp, ainda em processo de certificação. 

O professor Wilson explica que o JorCom trabalha com a contribuição do jornalismo para a  comunicação das organizações e empresas, ou seja, práticas como o relacionamento com a mídia e edição de publicações como revistas e jornais.  Já o jornalismo especializado  seria  um tipo de jornalismo que envolve atividades e cobertura de temas mais específicos, ainda que de interesse geral. Alguns dos mais comuns são o jornalismo científico, o jornalismo ambiental, o jornalismo na área de saúde, e o jornalismo rural ou agropecuário. 

Foto de pessoas trabalhando em um grande escritório com baias. Cada pessoa está sentada em frente de  um computador. Há cabos, controles e objetos sobre as mesas. Ao fundo, pilares com monitores de TV, algumas plantas, paredes e teto brancos.
Foto:  José Cruz/ Agência Brasil. 

O docente utiliza o jornalismo científico como exemplo para explicar a importância do jornalismo especializado, uma vez que ele estimula a divulgação das pesquisas e de seus resultados e contribui para o combate à desinformação e propagação de notícias falsas e tendenciosas. Ele reforça o papel das universidades em, além de produzir ciência, divulgar suas produções científicas com cada vez mais qualidade.

Bueno também afirma que “o jornalismo científico competente contribui para mostrar as evidências científicas, os fatos científicos. Ele se baseia nas pesquisas de ciência e não no impressionismo ou em motivos de viés religioso ou ideológico. O jornalismo científico contribui para marcar essa diferença entre o que é baseado em fatos e evidências científicas e o que é especulação ou até má vontade”.

As razões para se pesquisar o jornalismo especializado vêm do interesse da população acerca de temáticas específicas, segundo o professor. As inovações nos campos de ciência, tecnologia, inovação, saúde, meio ambiente e agropecuária sempre geraram interesse na sociedade. Logo, a cobertura jornalística dessas áreas é importante para atender essa demanda, além de ter importância para o país. 

 

"Quanto mais profissionais e pesquisadores nós tivermos nessa área, mais competente será a divulgação da ciência, do meio ambiente, da saúde e da agropecuária. Os grupos [de pesquisa] são importantes. São pessoas que se reúnem para tratar da discussão sobre como divulgar notícias dessas áreas."

Wilson Bueno, docente sênior do Departamento de Jornalismo e Editoração

 

O JorCom e a criação do JornEsp

No início de suas atividades, o JorCom não tinha uma linha de pesquisa dedicada ao jornalismo especializado. Ela só foi estabelecida após a pandemia de covid-19, e, desde então, as pesquisas nessa linha se desenvolveram até dar corpo à proposta de criação de um novo grupo de pesquisa, o JornEsp. 

 

"A gente achou que [o jornalismo especializado] era tão importante que ele não podia ser um subproduto do jornalismo organizacional, ele tinha que ter vida própria."

Wilson Bueno, docente sênior do Departamento de Jornalismo e Editoração

 

Hoje, os 64 grupos de pesquisa em jornalismo especializado existentes no Brasil somam por volta de 500 pesquisadores e 500 estudantes. Aproximadamente 60% das pesquisadoras são mulheres. Além disso, 80% desses grupos estão presentes em universidades públicas. 

Os grupos de pesquisa têm um campo de atuação definido para que haja visibilidade e atraiam mais pesquisadores. Wilson afirma que a criação do JornEsp reconhece a importância crescente que a cobertura e a divulgação de temas nessas áreas têm e que acha importante unir pesquisadores em jornalismo especializado.  Ele ainda chama atenção para o fato do JornEsp ser um grupo pioneiro na linha de pesquisa de jornalismo rural.

 

40 anos da tese Jornalismo Científico no Brasil: os compromissos de uma prática dependente, de Wilson Bueno

Foto de um homem branco sorrindo. Ele tem cabelos brancos, um paletó preto e uma camisa cinza. O fundo da imagem é desfocado
Wilson da Costa Bueno (CJE) - Foto: Acervo Pessoal

Wilson Bueno ingressou na ECA na segunda turma de Jornalismo, em 1968. Um ano antes, havia entrado em Matemática, também na USP. Ele afirma que teve uma grande relação com as áreas de ciências, ciências exatas e jornalismo. Como jornalista, o docente trabalhou em veículos especializados na área de divulgação científica e conta que daí veio o tema de sua pesquisa na pós-graduação. 

“Eu fui presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Científico, portanto, havia uma relação minha, tanto na área acadêmica, por causa da matemática, como na área profissional, com a área de ciência e tecnologia”, afirma o docente.

A tese, que foi a primeira a tratar desse tema no país, foi defendida no dia 13 de março de 1985 e apontou, entre suas conclusões, a predominância de pesquisas realizadas por instituições estrangeiras na divulgação científica feita à época pelos veículos de impresa brasileiros. Desde então, muitas outras teses e dissertações voltadas ao jornalismo científico foram defendidas por outros pesquisadores, das quais aproximadamente 50 foram orientadas por Wilson. 

De lá para cá, houve várias mudanças no jornalismo científico do Brasil. Uma das principais foi o  crescimento na divulgação de estudos de ciência, saúde e meio-ambiente feitos no país. Segundo Bueno, isso aconteceu “porque as próprias universidades [e instituições], foram estruturando áreas de divulgação, foram criando estruturas de comunicação e começaram a divulgar as pesquisas realizadas internamente. Nós tivemos um crescimento grande da área de comunicação. Já se fazia ciência [...] [mas] tinha menos recursos, e divulgava-se menos porque a gente não tinha uma estrutura de comunicação”.

Outra mudança entre o momento da tese e hoje é o crescimento e o desenvolvimento de novas tecnologias que propiciaram o aumento da divulgação, uma vez que naquela época isso era muito caro e, atualmente, há materiais disponíveis de forma online e gratuita, facilitando a produção e o acesso. 

O docente afirma: “tudo isso foi contribuindo. Não só pelas estruturas de comunicação [e pelas] instituições de pesquisa, mas pelo fato de ter o computador, de ter internet, de ter os canais de vídeo, de ter as plataformas, as mídias sociais, isso cresceu bastante. Hoje, nós temos uma divulgação científica pelas mídias sociais”. Ele continua a comparação entre o momento de seu doutoramento e os dias atuais: “isso não existia na época, era tudo em papel. Como era papel, era caro e de difícil conhecimento das pessoas. Era difícil circular a informação. Só quando a gente ia para o congresso que era presencial, que a gente contava o que a gente tava fazendo”. 

A tese Jornalismo Científico no Brasil: os compromissos de uma prática dependente está disponível no Banco de Teses da USP. 

 

 


Foto de capa: Marcos Santos/ USP Imagens.
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