CJE | Departamento de Jornalismo e Editoração



Dossiê sobre 200 anos da Independência questiona Brasil soberano e moderno

Docente da ECA participa de curadoria de textos e assina artigo da revista do Instituto de Estudos Avançados da USP 
 

Vida acadêmica

Os professores Antônio David, do Departamento de Jornalismo e Editoração (CJE) da ECA, Carlos Zeron e Alexandre Saes, ambos também da USP, foram responsáveis pela curadoria de uma série de textos que provocam reflexões sobre o aniversário de 200 anos da emancipação política do Brasil em relação a Portugal.

O dossiê “Bicentenário da Independência”, publicado na Revista de Estudos Avançados - periódico do Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP -, foi construído, segundo o professor Antônio, a partir de questionamentos acerca dos limites dos conceitos de modernidade e soberania. De acordo com ele, essas concepções foram “ideais marcantes nas últimas décadas no Brasil, seja no pensamento, seja na ação.”

No editorial da revista, o sociólogo e professor Sergio Adorno aponta que os textos tratam das “tensões entre memória, política e escrita da história ao colocar em evidência diferentes narrativas sobre a Independência como fato e processo histórico".

Entre os temas analisados no dossiê, Adorno destaca fatos relevantes para o entendimento do Bicentenário, como: 

  • A construção da esfera pública desde a Independência e suas crises; 
  • As práticas racistas e xenofóbicas que violam direitos humanos;
  • As dinâmicas sociais que estabelecem a existência de grupos armados; 
  • A potencial catástrofe ambiental de biomas nacionais;
  • Os padrões de acumulação e segregação socioespacial em São Paulo.

 

3 vezes 22

 

Foto de uma parte do Monumento à Independência, o conjunto escultórico Marcha Triunfal da Nação Brasileira. Dois cavalos estão à frente de um grupo de personagens: no alto, uma mulher com vestes esvoaçantes e um mastro nas mãos representa o Brasil; ao seu lado, homens e mulheres com diferentes tipos de vestimenta, incluindo um homem indígena, carregam artefatos como cruz, lança e tocha. A obra, que tem aparência desgastada, está apoiada em uma base de granito branco com adornos nas bordas. Ao fundo, o céu é bem azul e com poucas nuvens.
O Monumento à Independência, que fica próximo ao Rio Ipiranga, foi inaugurado em 1922 em comemoração ao centenário da emancipação. Na foto, o conjunto escultórico Marcha Triunfal da Nação Brasileira, no topo do monumento. Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

O artigo de abertura do dossiê, intitulado 3 vezes 22: ideias de Brasil moderno e soberano em torno de 1822, 1922 e 2022, é de autoria dos três curadores e dá enfoque à revisão da construção do pensamento histórico-econômico no passado e no presente para refletir sobre o Brasil. Para isso, os professores analisam ensaístas que refletiram sobre as noções de soberania e modernização em diferentes momentos dos séculos XX e XXI, tais como, entre outros:

  • O sociólogo Octavio Ianni, que se destaca ao argumentar que “o Brasil ainda não é propriamente uma nação”;
  • O sociólogo Florestan Fernandes, cuja vida foi marcada por expectativa e decepção diante dos ideais de soberania e modernização no país;
  • O filósofo Paulo Arantes, que revisita momentos importantes da história - como a crise do sistema colonial, a queda do muro de Berlim e o fim da União Soviética - em sua análise sobre as décadas mais recentes;
  • O historiador Reinhart Koselleck, que aborda as diferenças e distâncias entre o campo de experiências e o horizonte de expectativas.

Antes de concluir o texto, os professores apresentam o seguinte questionamento:

 

“Em 1822, as experiências republicanas e antiescravistas na América Latina podiam sugerir caminhos para a construção da nação; em 1922, as experiências das democracias e das industrializações atrasadas foram assimiladas pela geração modernista para pensar um Brasil moderno. Quais são os modelos de 2022? Eles existem?"

 
Antônio David (ECA); Carlos Zeron (FFLCH) e Alexandre Saes (FEA)

 

 

Há o que comemorar?

 

Diante do cenário investigado ao longo do artigo, os autores se perguntam qual deveria ser o motivo das comemorações dessas datas, afinal “soberania (1822) e modernidade (1922) são conceitos que, se já eram inconsistentes por aqui, agora parecem ter pedido qualquer espessura.”

ECA no Ciclo 22 

 

Outras análises como esta, que refletem sobre os marcos de 1822, 1922 e 2022, fazem parte do Ciclo22. A iniciativa da USP propõe ainda, além do estudo sobre o passado e presente, debates a respeito dos projetos para o Brasil nos próximos 100 anos. A participação da ECA no Ciclo22 conta com produções artísticas, teses, artigos, reportagens e entrevistas.

O professor Antônio narra que ele e os colegas buscaram “escrutinar o percurso dessas ideias [de soberania e modernização], apontando para seu recorrente fracasso, o que talvez se mostre com maior evidência no tempo presente, mais do que em outros momentos." Apesar do diagnóstico pessimista, o docente complementa que, caso essa hipótese esteja correta e realmente não haja garantia de um futuro de prosperidade para todos, “abrem-se novos horizontes para o pensamento e mesmo de atuação política”.

 

 

 

 

 


Imagem da capa: Detalhe da pintura Independência ou Morte, de Pedro Américo. Fonte: Reprodução/ Ciclo 22