CJE | Departamento de Jornalismo e Editoração



Livrarias de bairro e hábito de leitura: os novos caminhos para o livro

Para o professor Plínio Martins Filho, do curso de Editoração, o Brasil deve investir em políticas públicas de incentivo à leitura na infância e propor estratégias de proteção às pequenas livrarias

Comunidade

“Toda criança gosta de ler”, defende o editor e professor Plínio Martins Filho. Distração e fonte de conhecimento, o livro é capaz de atrair a primeira infância com facilidade. Em algum momento durante a adolescência, no entanto, isso muda. E esse pode ser um dos principais agravantes dos problemas no mercado editorial brasileiro.

“Não existe, infelizmente, uma política de criação de hábitos de leitura no país”, afirma o docente do Departamento de Jornalismo e Editoração (CJE). Na adolescência os interesses mudam, especialmente com as novas tecnologias e mídias digitais. E como o livro pode competir com isso? Para Plínio, “talvez faltem estudos sobre uma literatura de transição entre infância e adolescência; uma literatura que mantenha esse hábito nos jovens.”

Você sabia? 

A USP oferece um Auxílio-Livro para seus estudantes de graduação no valor de R$ 150 créditos mensais (exceto nos meses de janeiro e julho). Para receber o auxílio o estudante precisa estar inscrito no PAPFE. As inscrições costumam ocorrer no mês de janeiro.

Além da crise vivida pelas livrarias e a baixa na taxa de leitura do país, o público também se depara com outra questão: os preços. O docente, no entanto, acredita que o problema não está no valor do livro e sim no poder aquisitivo da população brasileira, dificultado pela atual crise econômica. 

“Na verdade, o livro brasileiro é um dos mais baratos”, explica. “Quando o poder aquisitivo da população aumenta, a venda de livros também aumenta. Eu falo isso por experiência, porque eu vi acontecer. Quando o Brasil teve períodos de melhora financeira, as gráficas nem davam conta de imprimir tantos livros.”

Hoje, o mercado tenta se recuperar da instabilidade que vive há alguns anos. E, aos poucos, o livro está encontrando novos caminhos para seguir em frente. Para o editor, a resposta está nas políticas públicas de incentivo à leitura e no surgimento das livrarias de bairro.

 

A importância da criação do hábito de leitura
 

Segundo a última pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada pelo Instituto Pró-Livro (IPL), Itaú Cultural e IBOPE Inteligência, houve uma queda de 4,6 milhões de leitores e leitoras entre 2015 e 2019. Entre as crianças de até 10 anos, contudo, o número aumentou de 67% (2015) para 71% (2019).

No primeiro plano uma garota de cabelo preto cacheado está deitada em um sofá  azul. Ela veste um short amarelo e rosa, uma blusa branca estampada e um chapéu listrado em cores cinza. Com os braços erguidos, ela segura um livro de capa azul.
Dia 18 de abril é o Dia Nacional do Livro Infantil. Já em 23 de abril se comemora o Dia Mundial do Livro. Foto: Agência Brasil

Os dados reforçam a necessidade de políticas públicas para desenvolver o hábito de leitura na infância e garantir sua continuidade durante a adolescência e a vida adulta.

Plínio cita como exemplo um projeto de José Mindlin, responsável pelo acervo da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin. “Ele tinha uma proposta de incluir nos cursos de formação, desde o primário, aulas de leitura, por pelo menos uma hora por semana. Essas são ideias que a gente precisa retomar."

 

“O livro transforma a vida das pessoas; ele faz as pessoas. Ele é o instrumento da história e da ciência e sua importância é fundamental. Impresso ou digital, o essencial é que seja lido.”

Plínio Martins Filho, docente da ECA

 

Além disso, o papel de mães, pais e responsáveis é fundamental. “Os pais, em sua maioria, não têm uma formação que os ajude a dar continuidade ao hábito de leitura dos filhos. Às vezes eles não estão preparados, não sabem como agir. Esse é outro ponto que precisa ser estudado”, diz o professor.

 

Livrarias como espaços sociais e culturais
 
Fotografia das estantes da livraria com algumas pessoas ao fundo mexendo nos livros. No primeiro plano uma estante com diversos livros com capas nas cores vermelho, amarelo, azul e marrom.
Livraria Megafauna, localizada no edifício Copan em São Paulo, foi inaugurada em 2020 e integra o movimento de livrarias de bairro. Foto: Divulgação

Durante a pandemia, o mercado digital foi decisivo para a sobrevivência das livrarias e editoras. Segundo pesquisa anual feita pela consultoria Nielsen em parceria com a Câmara Brasileira do Livro e o Sindicato Nacional dos Editores de Livros, as livrarias virtuais cresceram 84% em vendas de exemplares físicos.

“A pandemia, de fato, ajudou a valorizar esse tipo de aquisição. Isso é tão verdade que na Festa do Livro de 2020, que foi virtual, todos os editores venderam três vezes mais do que se ela fosse presencial”, afirma Plínio.

Mesmo com as facilidades criadas pela internet, ele defende a livraria física como principal canal de vendas das editoras. O maior problema atualmente são os modelos das grandes redes. “Uma grande livraria está parecendo um parque de diversão. Em algumas o livro já não é mais o produto principal.”

Por isso, o movimento de pequenas livrarias, também chamadas de livrarias de bairro, vem crescendo. Tendo o livro como seu protagonista, esses locais ganham cada vez mais simpatizantes e funcionam como espaços culturais. 

“Essas livrarias têm muitas chances daqui para frente porque existe uma necessidade social desse tipo de espaço. A livraria sempre foi isso e nós precisamos defender esses locais, porque eles são a diversidade”, diz.

 

“A livraria não é somente um ponto de venda de livros, mas também um ponto social, de encontro de ideias, de convivência entre as pessoas.”

Plínio Martins Filho, docente da ECA

 

Para ele, no entanto, é preciso que haja uma regulamentação nos preços dos livros durante os lançamentos. Assim as pequenas livrarias terão condições de competir com grandes empresas como a Amazon, famosa por suas políticas de ofertas.

Em seus mais de 50 anos de experiência com os livros, Plínio os define como agentes de transformação. “Eu não tinha a mínima ideia de que um dia iria me tornar um editor. Então sim, o livro de fato transforma a vida das pessoas; ele faz as pessoas. E eu acho que existe, no Brasil, um potencial muito grande para as editoras. O que precisamos é de apoio e políticas públicas que incentivem o consumo da leitura.”


Plínio Martins Filho, editor e educador
 

Plínio Martins Filho nasceu na cidade de Pium, interior do Tocantins, e veio para São Paulo em 1971. Começou trabalhando no depósito da Editora Perspectiva e, a partir de então, aprendeu o processo de revisão de obras e se dedicou por completo à editoração. 

Foi diretor editorial e presidente da Edusp, a editora da USP, de 1988 até 2016, período em que foram lançados mais de 1.600 livros no catálogo da editora. Atualmente, leciona no curso de Editoração da ECA, coordena a editora-laboratório Com-Arte, é editor do setor de publicações da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin e vai retomar, neste ano, o comando da Edusp.