A influência da comunicação na cultura organizacional durante a pandemia

Hábitos adquiridos durante o isolamento social enfatizam o papel da comunicação para além da disseminação de informações e apontam tendências para o futuro

 

Vida acadêmica
Foto de uma mulher branca de cabelos loiros e lisos na altura do pescoço. Ela tem olhos verdes, está maquiada e sorri, olhando diretamente para a câmera.
Roseane Andrelo. Foto: Reprodução Lattes 

São  evidentes as mudanças trazidas pela pandemia de covid-19 no âmbito social, principalmente aquelas que envolvem a internet e as redes como um meio possível para a realização de diversas tarefas. Tal impacto pode ser verificado em indivíduos, mas também na cultura organizacional de uma empresa. É disso que trata o artigo Comunicação e cultura organizacional no home office: perspectivas de líderes na pandemia, escrito por Roseane Andrelo e Guilherme Ferreira de Oliveira, ambos pesquisadores da área de Relações Públicas pela Unesp. O artigo pertence ao Dossiê 43 da Revista Organicom.

Foto de um homem branco de cabelos cacheados, curtos e escuros e com barba e bigode. Ele utiliza um piercing na sobrancelha e brinco de argola na orelha. Atrás dele há uma paisagem com grama verde, terra, céu azul e alguns prédios.
Guilherme Ferreira. Foto: Reprodução Lattes 

Durante a pandemia, as organizações tiveram de adotar medidas de emergência e se adaptar ao novo cenário. Tais rearranjos variaram entre a procura de novos modelos de negócio, por exemplo os e-commerces e o delivery, e a prática quase que obrigatória do home office para a equipe de funcionários, principalmente antes da chegada das vacinas. 
 

De acordo com os autores do artigo, para o funcionamento pleno das empresas com o trabalho remoto, novas práticas tiveram de ser incorporadas ao dia a dia dos colaboradores. No âmbito da comunicação, tiveram de ser adotadas medidas para possibilitar efetivamente o diálogo entre os trabalhadores, seja para a circulação de informações ou para as relações interpessoais. A pesquisa buscou, a partir de revisão bibliográfica e de entrevistas em profundidade com um grupo de gestores, entender como a comunicação pode contribuir para a construção de uma cultura organizacional no contexto de home office. 

 

O perfil dos entrevistados 

Entre maio e junho de 2022 foram entrevistados cinco gestores de quatro empresas distintas, atuantes na área da comunicação, seja RH, comunicação interna ou gestão de pessoas. Esses profissionais trabalhavam em quatro organizações privadas de diferentes portes que não foram identificadas, sob a justificativa de que “a pesquisa não tem como objetivo analisá-las em específico, mas sim compreender as percepções e sentidos construídos sobre os fenômenos da comunicação e da cultura no trabalho remoto”. 

Enquanto duas empresas adotaram o trabalho remoto para todos os colaboradores durante a pandemia e continuam com esse regime até os dias de hoje, em outra o trabalho remoto já era uma opção para alguns mesmo antes do isolamento social. Na quarta empresa, por pertencer ao setor industrial, apenas a parte administrativa da organização pode migrar para o home office.

A primeira delas constitui uma plataforma de serviços de recursos humanos, a segunda faz parte de uma multinacional de bebidas e alimentos, a terceira é uma empresa gráfica também multinacional e a última consiste em uma plataforma de serviços de atendimento ao consumidor. As empresas escolhidas foram aquelas que se destacaram por iniciativas de comunicação no trabalho remoto, principalmente por meio de notícias e engajamento nas redes sociais.

 

O que pensam os gestores? 

Em síntese, todos os gestores apontaram a necessidade de disponibilizar informações sobre a pandemia para o público interno da empresa, principalmente por meio de rodas de conversa, lives e conteúdo sobre saúde mental. Além disso, indicaram a importância de explicar o que ficou diferente na empresa com a adoção do trabalho remoto e como ela se adaptou a essa nova realidade, bem como proporcionar interação entre os trabalhadores. 

Para isso foram utilizadas estratégias como a criação de um boletim interno para informar os trabalhadores sobre o cenário da empresa, além de newsletters com notícias e atualizações sobre a estrutura de trabalho. O email também foi utilizado para divulgar informações sobre protocolos internos e decretos governamentais relacionados à pandemia. Outra estratégia consistiu na criação de canais no WhatsApp nos quais apenas RH e as lideranças da empresa enviavam mensagens de cunho informativo. 

 

Fotografia vista de cima de um notebook aberto, cinza com teclas pretas, apoiado sobre uma superfície preta. Ele está ligado e em sua tela há algumas imagens e textos. Sobre seu teclado estão as mãos de uma pessoa, que veste camisa branca de mangas longas, uma das mãos segura uma pequena xícara de café e a outra repousa sobre as teclas do notebook. Ao lado do notebook há um bloco de notas branco de espirais pretas, sobre o qual estão óculos de armação preta.
A gestão de tempo e de processos, a divisão de tarefas e a separação entre vida pessoal e profissional são questões presentes no trabalho remoto. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil 

 

As pessoas entrevistadas afirmaram que há uma grande diferença de integração entre os membros da equipe no trabalho presencial e no trabalho remoto. “No trabalho remoto, poucas informações eram conhecidas sobre a vida pessoal de cada funcionário, como perda de emprego de parceiros, casos de covid-19 em familiares, ou internações”, comenta o entrevistado da terceira organização. Além disso, o aumento de contratações de funcionários de diferentes regiões do país contribuiu para um menor conhecimento individual sobre os colaboradores. No entanto, foram criados meios como reuniões virtuais e um perfil fechado no Instagram para promover interação e divulgar aniversários como uma forma de aproximar essa relação. 

A partir dos depoimentos, foi possível entender que a comunicação, além de ter um papel de transmissora de informações, pode contribuir para a formação de novos hábitos culturais no trabalho remoto, enfatizando a importância da interação, proximidade e informalidade. De acordo com os autores, “os gestores reconhecem a relação entre a comunicação e a manutenção de relacionamentos à distância no trabalho remoto”. Por fim, Roseane e Guilherme ressaltam que  os dados coletados pelas entrevistas partiram de um conjunto limitado de fontes, de forma que não é possível afirmar que os resultados da pesquisa refletem a totalidade das empresas brasileiras. De todo modo, concluem que “Os apontamentos deste cenário podem dar pistas de como a comunicação tende a se desenvolver no ambiente interno das organizações, mesmo após o período pandêmico."

 

Revista Organicom 

 Capa da revista. O fundo é branco. Na parte superior encontra-se o título da revista, “Organicom”, em letras grandes e vermelhas. Abaixo, do lado esquerdo há uma lista com o nome dos colaboradores e do lado direito o número e nome do dossiê: “Dossiê 43 Comunicação, Cultura e Liderença”. Do centro para baixo da imagem há um desenho geométrico com figuras circulares ligadas por traços em dois tons de vermelho, variando entre traços grossos e finos.
 Capa do Dossiê 43 da Revista Organicom.
Imagem: Reprodução/Organicom
 

A Revista Organicom é um periódico quadrimestral que traz discussões nas áreas de Relações Públicas e Comunicação Organizacional. Seus números contam com artigos, depoimentos, resenhas, entrevistas e pesquisas de especialistas e, em cada edição, é publicado um dossiê temático. Os textos são voltados para a sociedade e buscam uma linguagem acessível, envolvendo temas vigentes tanto na academia quanto no mercado. Seu corpo editorial é composto por Margarida M. Krohling Kunsch, Luiz Alberto de Farias e Valéria Siqueira Castro Lopes, todos professores da Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo (CRP) da ECA USP.

O Dossiê 43, de dezembro de 2023 e intitulado Comunicação, Cultura e Liderança, conta com textos em língua portuguesa e espanhola. A edição reúne pesquisas teóricas e aplicadas que envolvem práticas e alternativas para refletir sobre os conceitos que nomeiam o dossiê. Entre os textos publicados, um artigo, um depoimento e uma resenha têm autoria de  pessoas vinculadas à ECA.

O artigo Reputação Sensível: narrativas que acionam sentimentos, emoções e afetos, que discute as dimensões sensíveis acionadas nos discursos da empresa de cosméticos Natura, tem como um de seus autores Cleusa Maria Andrade Scroferneker, que possui doutorado e pós-doutorado em Ciências da Comunicação pela ECA. Wilson da Costa Bueno, professor sênior do Departamento de Jornalismo e Editoração (CJE) contribuiu para a edição com um depoimento nomeado Cultura organizacional e comunicação como antídotos para crises institucionais. No texto, ele trata da adoção de processos e mecanismos para as organizações que permitam acompanhar as mudanças constantes no contexto social, econômico e cultural da sociedade. A resenha de nome Entre o tudo e o nada, de Luiz Alberto de Farias, livre docente do Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo (CRP) da ECA  trata do livro Públicos em movimento: Comunicação, colaboração e influência na formação de públicos, de Daniel Reis Silva e Márcio Simeone Henriques.

 

 


Imagem de capa: Reprodução PxHere