Diplomação de Nelson Kohl, aluno da ECA morto na ditadura
Na cerimônia de formatura dos estudantes da ECA realizada no dia 23 de outubro de 2024, aconteceu a diplomação de Nelson de Souza Kohl, estudante do antigo curso de Teatro da ECA assassinado pela ditadura militar. A iniciativa integra o projeto Diplomação da Resistência, da Pró-reitoria de Inclusão e Pertencimento da USP (Prip). Confira a seguir a íntegra do discurso proferido pela Pró-reitora de Inclusão e Pertencimento, professora Ana Lucia Duarte Lanna, durante a diplomação:
"Em uma semana de julho de 1971, na esquina da Rua Oscar Freire com Galeno de Almeida, um frio de inverno antecipado acompanhava Nelson e sua esposa, Elaine. Naquela ocasião, o casal informou ao sobrinho, que havia vindo de outra Cidade para estudar na USP e morava com eles, que iriam "desaparecer" e que ele não deveria esperar vê-los novamente. Essa foi a última conversa que Nelson teve com seu sobrinho.
Infelizmente, durante o período de repressão, muitos jovens como ele foram perseguidos, torturados e mortos. A lembrança de Nelson, assim como de outros que sofreram durante a ditadura, serve como um importante lembrete do preço da luta pela democracia. Sua história faz parte da memória coletiva que busca honrar aqueles que foram silenciados e que, como ele, representavam um ambiente vibrante e crítico, onde a busca por liberdade de expressão e justiça social era intensa.
Embora sua vida pessoal tenha sido marcada por desafios e incertezas, Nelson era repleto de sonhos e aspirações. Amigos e colegas o lembram como uma pessoa carismática, comprometida com suas convicções e sempre disposta a lutar por um mundo melhor. Seu comprometimento com a causa estudantil e sua coragem em se opor à repressão o tornaram um símbolo da luta pela verdade e pelos direitos humanos. Sua morte, em 1973, foi uma tragédia que ecoou entre estudantes e a sociedade civil, gerando indignação e resistência.
Militante do POC – Partido Operário Comunista -, Nelson se viu obrigado a sair do Brasil a partir de julho de 1971, quando uma grande repressão se abateu sobre esse partido, ferindo além disso de morte o seu coração, já que seu grande amigo de adolescência e com quem dividia moradia, Luiz Eduardo Merlino, foi assassinado sob tortura nas dependências do DOI-CODI de São Paulo. Nelson e sua companheira Elaine Beraldo foram então para a Argentina. Porém, seguindo uma orientação da organização, os dois se deslocaram em seguida para o Chile. Conforme o depoimento dos companheiros com quem vivia o casal, Celso Castro e Sandra Macedo, a casa, no bairro de La Cistina, foi invadida por 70 soldados da Força Aérea Chilena em consequência do golpe militar no Chile. Nelson, o único homem que se encontrava no local, foi levado em um caminhão militar sob o pretexto de averiguações, e foi assassinado um dia depois, em 15 de setembro de 1973.
Entretanto, a brutalidade de sua morte não apagou seu legado; ao contrário, fez com que sua voz ressoasse ainda mais forte nas gerações que o sucederam. Nelson nos ensina que a luta pela liberdade não deve ser esquecida e nos lembra da importância de estarmos sempre vigilantes contra a opressão.
Devemos valorizar cada vida, cada sonho e cada busca por um mundo melhor. Ao celebrarmos sua memória, renovamos nosso compromisso com os valores que ele defendia: a dignidade humana, a democracia e o respeito à diversidade. Que a lembrança de Nelson de Souza Kohl continue a inspirar nossas ações e nossa luta por um futuro onde a liberdade de expressão e os direitos humanos sejam sempre garantidos. Descanse em paz, Nelson. Sua coragem e seu sonho permanecem vivos em nossos corações."
Ana Lucia Duarte Lanna, Pró-reitora de Inclusão e Pertencimento da USP