É preciso falar sobre TEA: Abril, o mês de conscientização
Abril é um mês simbólico na luta por conscientização e inclusão de pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), especialmente em ambientes educacionais. Na Universidade de São Paulo, esse debate vem ganhando força com a recente publicação da Portaria PRIP059/2024, que estabelece diretrizes específicas para promover a inclusão de discentes, docentes e funcionários com TEA. As medidas propostas pela Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP) refletem o reconhecimento institucional da necessidade de adaptações pedagógicas, informacionais e atitudinais que assegurem condições equitativas de ensino, aprendizagem e trabalho para essa população.
As adaptações sugeridas vão desde ajustes simples, como o uso de fontes ampliadas em materiais visuais, até estratégias mais complexas, a reestruturação de avaliações e a criação de salas de acolhimento. Tais medidas visam não apenas remover barreiras estruturais, mas também reconhecer as especificidades cognitivas, sensoriais e sociais que impactam a vivência acadêmica de pessoas com TEA. Neste contexto, compreendê-las é um passo fundamental para promover um ambiente universitário mais acolhedor, justo e plural. Veja abaixo as possibilidades de adaptação em sala de aula:
- Necessidades do cotidiano de aula, como uso de fonte maior em slides;
- Diversificação de estratégias avaliativas (adaptação de provas, leitura oral da prova,
consulta a fórmulas por dificuldade de memorização, outros);
- Diversificação de estratégias pedagógicas, contemplando múltiplas formas de ensino;
- Explicações de procedimentos de forma regular e como rotina em períodos do início, meio e
fim das atividades;
- Acompanhamento de professor tutor ao longo do curso;
- Uso de fone de ouvido;
- Preferência por tarefas no formato individual;
- Tempo adicional para tarefas/trabalhos, provas e outras formas de avaliação;
- Sala de acolhimento para pessoas com TEA;
- Assistência para realização de provas;
- Separação de tarefas em blocos (partes);
- Atividades sem apresentação oral em público ou interação social;
- Material de apoio com fórmulas que precisem memorização;
- Ajuste no cronograma de atividades.
Segundo o Guia “Educando para a Diversidade”, produzido pela Universidade Estadual Paulista (UNESP, veja o link abaixo), alunos com TEA podem enfrentar dificuldades de adaptação que até podem aparecer também em alunos fora do espectro; a diferença é que pessoas com TEA não conseguem fazer esta adaptação de maneira rápida e sem o apoio necessário. Estas dificuldades vão de encontro às possibilidades previstas no plano de adaptação da CIP:
- Organizar e planejar o tempo, que inclui tarefas, trabalhos, materiais, provas, metas e objetivos de aprendizagem;
- Compreender e interpretar linguagens complexas, figuradas, literais e abstratas (metáforas, sarcasmos, ironias, piadas, duplos sentidos, etc.), inclusive questionamentos amplos, sem orientação específica;
- Interpretar corretamente comportamentos não verbais, expressões faciais, emoções, intenções, linguagem corporal e entonação de voz, bem com aplicá-los à sua prática social;
- Manter atenção e motivação constantes quando se tratam de atividades distantes dos seus temas de interesse;
- Realizar atividades grafomotoras (grafia ilegível, maior tempo para escrever e realizar uma prova, etc.), devido às alterações na coordenação motora fina;
- Executar várias atividades ao mesmo tempo;
- Manter contato visual;
- Lidar com estímulos sensoriais, pois possui hipersensibilidade sensorial (luzes muito intensas, ruídos extremos, cheiros, sabores ou texturas específicas, etc.);
- Flexibilizar suas rotinas e lidar com situações novas e inesperadas;
- Compartilhar interesses comuns;
- Reconhecer suas próprias habilidades e pontos fortes;
- Ter expectativas e cobranças excessivas e irreais;
- Saber como e quando buscar ajuda;
- Iniciar, manter e terminar uma conversa, devido às dificuldades na interação e na comunicação;
- Identificar assuntos apropriados ao contexto, de maneira a manter a conversa e não ser inconveniente;
- Estabelecer e manter relações pessoais constantes;
- Vivenciar mudanças;
- Realizar trabalhos em grupo;
- Apresentar oralmente e se expor diante de um público;
- Lidar com o isolamento social;
- Conseguir comunicar suas necessidades e preferências;
- Lidar com a falta de apoio e suporte educacional e social para enfrentar situações novas e desconhecidas no ambiente acadêmico;
- Lidar com preconceitos, discriminação, falta de compreensão e aceitação;
- Julgar adequadamente a intenção do outro e se defender adequadamente;
- Identificar as exigências do professor e as expectativas dos colegas;
- Cumprir com suas obrigações acadêmicas no tempo adequado e apresentar êxito no desempenho acadêmico.
Fonte: Guia sobre Transtorno do Espectro Autista
Os itens acima podem ser considerados um letramento básico para entender as necessidades específicas de pessoas com TEA no geral, lembrando que nunca um indivíduo é igual ao outro. Outro aspecto é que alunos com TEA também apresentam uma série de potencialidades, dentre elas:
- Facilidade no processamento visual e espacial das informações;
- Boa memória mecânica e de longo prazo, podendo vir a desenvolver habilidades extraordinárias em áreas específicas, como na música, na matemática, na pintura, no desenho, etc.;
- Atenção e precisão aos detalhes;
- Intensa dedicação, motivação, concentração e foco nas atividades e/ou temas específicos do seu interesse;
- Propensão para pensar racional e logicamente, permitindo a resolução de problemas por diferentes perspectivas e por soluções práticas;
- Respeito e adesão às regras estabelecidas e cumprimento delas;
- Gosto por seguir rotinas, adaptando-se com exatidão ao proposto;
- Elevado senso de justiça, sinceridade e honestidade;
- Amplo conhecimento e curiosidade sobre temas específicos e por entender o funcionamento das coisas;
- Facilidade com tarefas mecânicas, precisas e repetitivas;
- Extenso vocabulário e facilidade em aprender diferentes línguas;
- Comportamento de escuta elevado, mostrando-se bom ouvinte.
Fonte: Guia sobre Transtorno do Espectro Autista
Embora os desafios enfrentados por pessoas com TEA sejam diversos e demandem atenção especializada, é igualmente importante reconhecer suas potencialidades e os recursos singulares que podem trazer à vida acadêmica e institucional, como vimos acima. No entanto, a implementação efetiva da política de inclusão depende do comprometimento de toda a comunidade universitária, especialmente no que diz respeito à sensibilização, ao respeito às diferenças e à responsabilidade compartilhada por um espaço mais acessível. Assim, construir uma universidade verdadeiramente inclusiva não se limita a cumprir diretrizes formais, mas exige um exercício contínuo de empatia, escuta e transformação das práticas cotidianas de ensino e convivência.
Link
Coletivo Autista da USP
Tenho um aluno autista, e agora? Guia sobre autismo para professores e funcionários da USP
https://drive.google.com/drive/folders/166PzUYbP_kHQ6HAGR2H04L-4jGqFZ0SJ
Site: https://linktr.ee/cautistausp
Guia sobre Transtorno do Espectro Autista
https://educadiversidade.unesp.br/guia-de-orientacoes-sobre-transtorno-do-espectro-autista/
Portaria PRIP059 - TEA
https://prip.usp.br/wp-content/uploads/sites/1128/2024/11/Portaria_PRIP_059-TEA-Errata.pdf
Referências:
CIP da Faculdade de Educação (FE)
https://www4.fe.usp.br/cip/pessoas-com-deficiencia/orientacoes-a-docentes