Você sabe o que define um turista?
Artigo da Revista Turismo em Análise analisa as percepções de gestores de destinos
Segundo dados da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), só em janeiro deste ano o turismo nacional foi responsável por movimentar cerca de 20,5 bilhões de reais. Apesar da importância do setor, o artigo O que Define um Turista? Da teoria à compreensão dos gestores de destinos mostra que é difícil definir com precisão o sujeito que realiza turismo.
O artigo, publicado na edição mais recente da Revista Turismo em Análise, foi escrito por João José dos Santos Junior, doutorando em Mudança Social e Participação Política na Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH-USP) e mestre em Turismo pela EACH, Cecília Galvão Fonseca, mestranda em turismo da EACH, Débora Regina Campos Candido, mestre em tecnologia ambiental pela UFF e Glauber Eduardo de Oliveira Santos, professor e coordenador do programa de pós-graduação da EACH.
O termo “turismo”
A revisão de literatura do artigo aponta que as origens da palavra "turismo" estão em dois termos, um latino (tornare) e um grego (tornos), que se referem a círculos e ao movimento circular. Já os anglófonos tourism e tourist foram criados a partir do francês tour, que denota viagens motivadas pelo lazer ou estudo — essas, inclusive, são as principais motivações associadas à caracterização clássica de um turista. Com o tempo, foi necessário adaptar a abrangência da palavra para incluir, também, as viagens motivadas pelo trabalho, família ou religião, por exemplo.

Mas a definição do que é turismo, segundo o artigo, é algo incerto. O texto ressalta que o “turismo não é uma categoria natural ou universal. Portanto, não há definição intrinsecamente correta ou incorreta”. Por essa razão, a pesquisa, ao invés de discutir quais critérios efetivamente definem um turista, “buscou estudar o que se entende por turista”, considerando as diferentes percepções possíveis sobre o termo.
“Língua é uma construção social. Logo, o significado de turista nada mais é do que um recorte socialmente construído de um universo de elementos concretos.”
João José dos Santos Junior, Cecília Galvão Fonseca, Débora Regina Campos Candido e Glauber Eduardo de Oliveira Santos, pesquisadores
Apesar do conceito incerto, os autores afirmam que “a adoção de sentidos distintos para a mesma palavra prejudica diversos debates e decisões”, como os que são feitos na gestão pública. Eles citam o caso das viagens de trabalho, que não têm aceitação unânime como forma de turismo. Com isso, órgãos administrativos podem subestimar os impactos dessa categoria de viagem e não investir o suficiente para suprir a demanda, por exemplo.
Como referência para a administração pública em destinos, a ONU Turismo lançou, em 2008, o International Recommendations for Tourism Statistics (Manual de Recomendações para Estatísticas de Turismo, em tradução livre do inglês). O material propõe que o turismo é “um fenômeno social, cultural e econômico relacionado ao movimento de pessoas para fora de seu lugar de residência habitual, com a motivação usual sendo o lazer”.
Outra definição do Manual relaciona o turismo à atividade dos visitantes — que são aqueles que viajam com qualquer motivação que não o emprego no local de destino. O visitante, nesse sentido, é quem realiza o turismo. No entanto, a conceituação do turista em si só ocorreria com o pernoite do visitante. Caso contrário, em viagens popularmente chamadas de “bate e volta”, o termo designado pelo Manual é “excursionista”.
Para os autores do artigo, “apesar dos esforços da ONU Turismo e outras entidades e pessoas para difundir o conceito de turismo que inclui viagens que não são de lazer, essa noção ainda não foi amplamente adotada”.
A opinião dos gestores de turismo

A pesquisa foi realizada com a aplicação de questionários a 81 gestores de destinos turísticos em Minas Gerais e no Rio de Janeiro. Destes, 47% possuía alguma formação, seja ela técnica ou superior, em turismo. As 23 perguntas eram compostas pela descrição de uma situação hipotética acompanhada do questionamento: “Pode-se dizer que essa pessoa é turista?” Elas buscaram verificar a percepção dos gestores em diferentes situações de duração da viagem, pernoite, proximidade do visitante de seu entorno habitual e a sua motivação.
A pergunta inicial foi também a de maior unanimidade: “Uma pessoa reside em São Paulo e vai ao Rio de Janeiro para conhecer a cidade, chegando na sexta-feira, hospedando-se em um hotel e voltando para casa no domingo. Pode-se dizer que essa pessoa é turista?”. Entre os gestores, 99% concordaram que sim.
Já os visitantes com duração prolongada de viagem não encontram a mesma aceitação: uma volta ao mundo de bicicleta ao longo de quatro anos não é considerada turística por 16% dos entrevistados. Um ano sabático na Itália também não se enquadra nessa classificação para 26% dos gestores.
Contrapondo a classificação da ONU Turismo que caracteriza viajantes sem pernoite como apenas excursionistas, 67% dos gestores consideram que esses visitantes são, sim, turistas.
Quando o assunto se relacionava ao entorno habitual, que engloba a área de moradia, trabalho, estudos e outras atividades rotineiras, as respostas não encontraram consenso. Se uma pessoa mora em uma cidade com um ponto turístico e vai visitá-lo, ela é turista apenas para 53% dos entrevistados. Já quem aluga um imóvel por um final de semana dentro da mesma cidade de residência, para aproveitar as instalações de lazer da casa, é considerado turista por ainda menos gestores — só 43% dos entrevistados responderam sim a essa pergunta.
Com relação à motivação do deslocamento, o questionário englobou 16 situações distintas. Um fim de semana hospedado na casa de um amigo em outra cidade configura turismo para 89% dos gestores. Mas a situação muda quando essa viagem é feita todos os finais de semana para visitar os pais e hospedar-se na casa deles (46% de concordância). Ainda menor foi a aceitação como turismo para situações de deslocamento sem pernoite para uma aula de campo universitária ou para compra de itens em polos comerciais para revender, como roupas do Brás (São Paulo, SP), ambas com 44% de concordância.
Revista Turismo em Análise
A Revista Turismo em Análise é uma publicação do Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo (CRP), que se dedica à divulgação de artigos sobre turismo. Desde 1990, ano de sua criação, o periódico já teve 35 edições.
A última edição da revista foi publicada no ano passado e contou com um total de nove produções, incluindo o artigo O efeito da cocriação de valor na intenção de revisita de destinos pelos turistas, escrito com a participação de Benny Kramer Costa, docente do CRP. Destaca-se também Influência da Rede Social TikTok na Intenção de Viagem: uma abordagem com a Teoria do Comportamento Planejado, de autoria de pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e do Instituto Federal de Mato Grosso.