Covid-19 expôs a importância do amparo governamental ao turismo
Divulgação, apoio governamental e expertise foram fundamentais para a retomada do turismo
Para o mercado de turismo, que vive em função do fluxo de pessoas, a pandemia de covid-19 foi um duro golpe. Milhares de viagens tiveram de ser adiadas ou até mesmo canceladas, sobretudo entre os anos de 2020 e 2021 - ainda que a pandemia tenha se estendido para o ano de 2022 -, frente às restrições de circulação e eventos que foram impostas pelas autoridades sanitárias locais. Só no Brasil, o setor acumulou uma perda de R$ 515 bilhões em receita desde março de 2020 e mais de 1 milhão de empregos diretos e indiretos.

Imagem: Fernando Frazão (Agência Brasil)
Diante desse cenário, empresários e governos redobraram esforços para atrair visitantes. Só este ano, a Embratur, a Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo, recebeu uma injeção de US$ 20 milhões para a promoção do Brasil mundo afora. Uma destas ações foi voltada para o público estadunidense, que corresponde ao segundo maior emissor de turistas para o país. “Visit Brazil. A wow experience” e “Brazil is visa-free. Come visit!” são duas campanhas que investiram em peças e banners em redes sociais, inserções nos intervalos das programações dos principais canais de TV, bem como a instalação de painéis e banners em cidades estratégicas, como Nova York e Los Angeles. Mais do que atrair novos turistas, o objetivo principal era manter o bom número de turistas oriundos dos EUA.
Se as grandes organizações do turismo (redes de hotéis, resorts e empresas de aviação e transporte marítimo) e agências estatais contaram com um orçamento razoável para reverter o quadro de crise através da propaganda, as pequenas empresas tiveram de se virar para se manter ativas, muitas vezes dependendo somente do capital humano para driblar os percalços.
Segundo o artigo Turismo, economia criativa e a covid-19 no Brasil: um estudo sobre a sobrevivência das micro e pequenas empresas, há uma relação direta entre o nível de escolaridade do gestor ou dono de pequenas empresas e a maior probabilidade de sobrevivência do negócio. O estudo, de autoria dos pesquisadores Angélica de Brito Pereira e Paulo Henrique Assis Feitosa, professor do Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo (CRP), foi publicado na Revista Eletrônica de Administração e Turismo.
O artigo investiga os fatores que condicionaram a sobrevivência das micro e pequenas empresas (MPEs) em atividades de turismo e da economia criativa durante a pandemia de covid-19, utilizando-se de um banco de dados original contendo informações de uma outra pesquisa sobre empresas do setor, cuja amostra foi de 244 empresas. O resultado indica que 35%, ao menos, das empresas analisadas têm mais de 10 anos de atividade, ao passo que 30% possuem entre 6 e 10 anos de existência, corroborando estudos anteriores que apontavam um enorme risco de falência no início de vida (segundo ano de atividade ) das MPEs. Só no setor de serviços, que abarca o turismo, estas empresas apresentam a pior taxa de sobrevivência (74,1%) no país, o que revela uma vulnerabilidade muito maior se comparado a outras áreas da economia.
De acordo com os autores do artigo, “as MPEs constituem uma estrutura fundamental para a geração de emprego e renda” na economia brasileira da atualidade, motivo pelo qual merecem maior atenção por parte dos governantes. E em momentos de turbulência, necessitam de uma resposta assertiva e rápida, restando poucas oportunidades para o erro. O estudo afirma que durante o primeiro ano de pandemia, as empresas com maior número de funcionários tiveram que adiar compromissos de pagamento antes das empresas de menor porte. Ou seja, mais do que o tamanho da empresa, o fator preponderante para sua sobrevivência foi a rentabilidade mensal.
Tal resultado contrasta com o que prega a literatura usual, já que estudos anteriores concluíram que as maiores empresas tendem a se sair melhor em contextos adversos. Uma explicação apontada no texto é que “a maior quantidade de funcionários acarreta também maiores custos para a empresa”, com demissões e rescisões de contratos trabalhistas. Os pesquisadores ressaltam que com a diminuição da demanda por serviços causada pela pandemia, o impacto destes custos acabou sendo ainda maior.
Apesar das MPEs brasileiras terem se adaptado à nova realidade dos últimos dois anos, como a digitalização de 85%, estudo do Sebrae realizado ainda no início da pandemia apontava para a necessidade do Estado ter políticas que auxiliem as micro e pequenas empresas do setor de Turismo. Tais políticas abrangem crédito facilitado e subsidiado, diferenciação de tributos e flexibilização dos contratos de trabalho. O estudo indicava ainda um redirecionamento de esforços para a promoção do turismo interno, na medida que se previa uma retomada gradual do turismo internacional, com a reabertura das fronteiras internacionais e a volta de voos que foram suspensos ou tiveram seu número reduzido.
Portugal, que atualmente é um dos principais destinos turísticos da Europa, recebendo quatro vezes mais turistas que o Brasil (segundo dados de 2019), é um exemplo de quem fez a lição de casa durante a pandemia ao lançar uma série de medidas voltadas para quase 9 mil pequenas e médias empresas a fim de mitigar os efeitos danosos na economia. Os 170 milhões de euros destinados pelo governo português foram fundamentais para assegurar mais de 40 mil postos de trabalho diretos e indiretos.
O direcionamento de políticas públicas para as MPEs é destacado pelos autores na conclusão do artigo, que enfatizam a necessidade de mais estudos para aprimorar as medidas de amparo e compreender melhor os principais fatores de resiliência das empresas. Ainda que o estudo seja inconclusivo sobre alguns destes fatores, Angélica e Paulo estimam ter contribuído para a melhora da gestão empresarial nesta modalidade de organizações, responsável por cerca de 6 milhões de postos de trabalho.
Imagem de capa: Tânia Rego (Agência Brasil)