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Mulheres são maioria entre estudantes de graduação e pós da ECA, mostra estudo

Artigo da revista Organicom utiliza dados de 2000 e 2019 para descobrir qual gênero predomina nos diferentes setores que compõem a ECA e a USP

Vida acadêmica

A edição de número 40 da Revista Organicom, intitulada Mulheres e feminismos: teorias, reflexões e processos comunicativos, foi publicada em março de 2023 com tom de pioneirismo. Em mais de 18 anos de existência, foi a primeira vez que o periódico abordou como tema a intersecção entre mulheres e a Comunicação. Este é um “momento inédito para promover o debate acadêmico na área da comunicação organizacional no Brasil e na América Latina”, afirma o editorial.

Foto de quatro mulheres negras sentadas conversando. A mulher que está mais à esquerda está gesticulando, as duas do meio estão olhando para ela e a mulher à direita faz anotações. Na mesa, também estão apoiados livros, celulares e um microfone.
Imagem: Amanda Ferreira/LAC

Reconhecendo o poder da Comunicação em fomentar agendas, os organizadores desta edição abrem espaço para debates sobre a participação e os desafios enfrentados pelas mulheres na sociedade. Além disso, enfatizam a relevância do periódico para “articular públicos multissetoriais para a ação conjunta e estimular mudanças em diferentes contextos, sem perder de vista as questões de classe, raça e gênero”.

Um dos artigos do dossiê busca examinar a presença feminina na Universidade, utilizando a ECA como objeto de estudo. A pesquisa Mulheres e Homens na USP e na Escola de Comunicação (sic) e Artes, entre 2000 e 2019 analisa as proporções de gênero nos diferentes grupos que compõem a comunidade universitária: estudantes, servidores docentes e servidores técnico-administrativos. O texto indica que, apesar de existir um certo equilíbrio de gênero no corpo discente, a desigualdade na docência é expressiva e perdura ao longo dos anos, tanto na ECA quanto na Universidade. 

Os dados foram coletados nos Anuários Estatísticos da USP e organizados em gráficos pelo Observatório USP Mulheres. Rodrigo Amaral, Rennan Valeriano e Maria Eduarda Martins, ex-membros do Escritório USP Mulheres — que teve suas atividades absorvidas pela Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP) no ano passado — são os autores do projeto e do artigo. No site do observatório, é possível acessar as informações e as estatísticas das outras unidades.

 

Números da ECA

De acordo com o estudo, a população ecana total é predominantemente feminina. Quase 55% dos membros da ECA eram do gênero feminino em 2019, o que representa um crescimento de 1,2% desde 2000. A população feminina da USP também cresceu cerca de 1% neste período, porém, esse aumento não foi o suficiente para equilibrar as porcentagens. Em 2019, os homens uspianos ainda somavam 53,2%.

Foto do perfil de três mulheres. As jovens estão sentadas uma ao lado da outra e olham na mesma direção. Ao redor delas, diversas pessoas estão sentadas também. Ao fundo, outras pessoas estão em pé.
Alunas durante a Semana de Recepção de 2023. Foto: Amanda Ferreira/LAC
 

Observando os recortes de vínculos dentro da ECA, é apenas na graduação que o número de mulheres vem subindo: após um crescimento de 5,5%, as graduandas totalizaram quase 58% deste grupo. Tanto na pós-graduação quanto no pós-doutorado, os índices femininos sofreram queda — de 4% e 6%, respectivamente — mas continuaram sendo maioria.

Contudo, a ECA, “assim como o conjunto da USP, trata-se de uma escola altamente masculinizada em seu corpo docente e entre seus servidores técnico-administrativos”, apontam os autores. O desequilíbrio de gênero nesses grupos é bastante significativo e aumentou de 2000 para 2019. A porcentagem de professoras foi de 36% para 34% e a de servidoras variou de 47% para 39%. Apesar da USP ter sofrido quedas e crescimentos de valores diferentes da ECA, os números da universidade também apontaram para um predomínio massivo de professores e técnico-administrativos  do gênero masculino.

 

O que os números revelam

Segundo os autores, este artigo pode instigar a realização de novas pesquisas sobre a divisão sexual das carreiras, um discurso presente na esfera familiar, no sistema escolar e no mercado de trabalho, que define quais carreiras são femininas e quais são masculinas. Esses novos estudos poderão “investigar as dinâmicas de reprodução que levaram à concentração de cada gênero em determinadas áreas e à pouca alteração dessa distribuição no curso de 20 anos”, acreditam. 

Foto de duas sentadas e usando máscara. À esquerda, está Brasilina, que é branca, tem cabelos curtos, lisos e loiros, veste uma camisa verde e um xale rosa. Ela fala em um microfone. À direita, Margarida, que é branca, tem cabelos curtos, lisos e escuros, veste um terno azul. Ela leva as duas mãos ao coração.
Brasilina Passarelli [à esquerda] e Margarida Kunsch [à direita] foram as únicas professoras que chegaram à diretoria da ECA. Imagem: Amanda Ferreira/LAC.

Já na pós-graduação, o artigo constata uma grande presença feminina. Os números evidenciam o papel da USP para as mulheres como uma possível ferramenta de mobilidade social através do estudo. Por outro lado, os baixos índices de mulheres na docência “confirmam como a mesma universidade frustra o investimento feminino na educação, restringindo o acesso das mulheres ao magistério superior ou, àquelas que conseguem tornar-se docentes, a progressão interna e o acesso às posições de liderança”, afirma o texto.

A pesquisa ainda apontou que, na Universidade, somente 30,6% das docentes mulheres conseguiram chegar à titularidade ao longo de 20 anos, o que também aumenta a discrepância entre as remunerações masculina e feminina. De acordo com Daniela Verzola Vaz, doutora em Economia citada no artigo, no funcionalismo público, são combinadas segregações ocupacionais e hierárquicas. Ou seja, as mulheres tendem a ser concentradas em posições de menor prestígio social e baixa remuneração ou, para aquelas que alcançam cargos de maior prestígio e remuneração, o acesso às funções de liderança é bloqueado.

Foto de diversas pessoas em pé, posando para foto. Das dezessete pessoas, doze são mulheres. Todos vestem roupas de frio. As pessoas estão numa sala de aula e, ao fundo, está uma projeção em um telão com a frase “Mindfulness/Atenção Plena” e a foto de uma pessoa meditando.
Servidora e servidores técnico-administrativos da ECA em encontro sobre Mindfulness. Foto:  Susana Narimatsu/LAC

Analisando as proporções de gênero dos servidores técnico-administrativos na USP, os autores perceberam uma reprodução da divisão sexual do trabalho. Este é um sinal de que esse fenômeno extrapola os limites das salas de aula e se reproduz nas unidades como um todo.  O artigo traz como exemplo as históricas presenças majoritárias de homens nas áreas de exatas e de mulheres nas ciências biológicas, tanto entre estudantes e docentes quanto entre funcionários. Além disso, a queda da participação feminina na composição de servidores “permite observar como as mulheres foram as mais afetadas pelas políticas de demissão incentivada adotadas em meados da década passada.”

Ecanas na Organicom

Essa edição do periódico apresenta outros dois trabalhos com participação ecana. O artigo Feminismo e Comunicação: uma relação necessária, escrito pela professora Claudia Lago, do Departamento de Comunicações e Artes (CCA), aborda e incentiva a interseção  do campo da Comunicação com os estudos feministas e de gênero, de modo que esta relação passe a nortear pesquisas na área.

Além disso, a professora Maria Aparecida Ferrari, do Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo (CRP), desenvolveu outro artigo, em conjunto com Milene Rocha Lourenço Leitzk, doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação (PPGCOM) da ECA. O Guia bibliográfico sobre mulheres e feminismos: novas perspectivas para o campo da comunicação reúne e comenta uma série de referências especializadas sobre estudos de gênero, mulheres e feminismos, a fim de estimular pesquisas  no campo.
 

 

 


Imagem de capa: Susana Narimatsu/LAC