Crise na Venezuela e cinema documental: duas pesquisas de iniciação científica da ECA

Premiados na última edição do SIICUSP, João Pedro Massa e Stella Bolina falam sobre a experiência de fazer pesquisa na graduação

Vida acadêmica

Dois estudantes da ECA receberam menções honrosas pelas suas pesquisas no  29º Simpósio Internacional de Iniciação Científica e Tecnológica da USP (SIICUSP), concluído no final do ano passado. João Pedro Malar Massa foi reconhecido por conta de seu projeto Análise da cobertura jornalística sobre a crise da Venezuela: estudo comparativo entre os jornais O Estado de São Paulo e Nexo Jornal nos anos de 2018 e 2019 e Stella de Souza Bolina, do Curso Superior do Audiovisual, recebeu a menção honrosa pela pesquisa Hanna Arendt e Eduardo Coutinho: storytelling, espaço político e a prática de liberdade no cinema documental.

Durante um ano, sob a orientação da professora Eun Yung Park, do Departamento de Jornalismo e Editoração (CJE), João Pedro fez o levantamento de 178 matérias produzidas pelos dois jornais em três momentos diferentes da crise da Venezuela: a eleição de 2018, a autoproclamação de Juan Guaidó, em 2019, e a tentativa de golpe de Estado, apoiada por Guaidó, também em 2019. Ele também entrevistou jornalistas dos dois veículos, responsáveis pela cobertura de política internacional.

Após a criação de uma base de dados, o pesquisador comparou o conteúdo dos dois veículos, levando em consideração a dinâmica de produção de cada um deles e o seu impacto sobre o conteúdo, a velocidade e a profundidade das matérias. João Pedro explica que enquanto o 'Estadão' um jornal mais antigo e tradicional, publicou centenas de matérias sobre a crise na Venezuela, o Nexo, um veículo bem mais novo e adepto do “jornalismo lento”, fez pouco mais de 20 reportagens sobre o tema. “Quando você entende a dinâmica de produção, você entende melhor porque eles estão produzindo aquele conteúdo”, explica o aluno. “E isso te mais respaldo para uma crítica mais contundente”.

 

“A pesquisa me deu a oportunidade de entender algumas coisas que eu acho que todo mundo devia entender. Mas nem todos os jornais explicam”. 

João Pedro Malar Massa, estudante de jornalismo

 

“É um aprendizado importante, principalmente para quem quer seguir na área de pesquisa”, e também traz ganhos profissionais, avalia João Pedro. “A pesquisa consegue te dar ideias do que fazer, de como produzir. Eu acho que dá um pouco de senso crítico também, de entender onde você está e a dinâmica das coisas”. O pesquisador também destaca o conhecimento que conseguiu, a partir dos estudos na iniciação científica, em dois temas de seu interesse pessoal. “Foi legal para aprofundar, por exemplo, o conhecimento de jornalismo digital e internacional que são áreas que são dadas no curso [de jornalismo], mas não com tanta intensidade”.

Além de ajudar a “entender um pouco melhor como o jornalismo funciona na prática”, a iniciação científica tornou possível compreender o processo científico como um todo - etapas, objetivos da pesquisa, relação com a orientadora, apresentação de resultados “e até a própria escrita acadêmica, que é muito diferente da escrita do jornalismo”.

João Pedro Massa, durante apresentação de seu trabalho de iniciação científica. Imagem: Reprodução/Youtube

 

Já a pesquisa de Stella foi baseada em uma hipotética teoria da estética de Hannah Arendt aplicada ao cinema documental de Eduardo Coutinho. Para a pesquisadora, o ponto de contato entre as duas figuras é a potência da arte de oferecer uma pluralidade de perspectivas. “O Coutinho faz o privilégio da ‘narrativa da pessoa’ e ele tem esses momentos [nas entrevistas que compõem os seus filmes] em que as pessoas acabam fugindo um pouco das expectativas sobre o que elas falariam”, explica Stella. Nessas instâncias, ocorre aquilo que Stella analisa como a prática do conceito de liberdade, de acordo com Arendt, em que uma ação não possui consequências premeditadas.

Diferente de João Pedro, que já finalizou o seu projeto, a apresentação de Stella no SIICUSP ocorreu enquanto sua pesquisa ainda estava em andamento. Por ora, Stella realizou um levantamento da filosofia Arendtiana e seu desafio é transpor os conceitos encontrados para o universo audiovisual, encontrando chaves de interpretação para os filmes a serem analisados. A aluna explica que sua pesquisa sofreu alterações nas últimas semanas, ganhando inclusive um novo título: O cinema documental à luz do pensamento Arendtiano: storytelling, espaço político e a prática da liberdade. Tanto Stella quanto João Pedro conta que foram eles próprios a levarem as ideias de seus projetos para as orientadoras a partir de gostos particulares em suas áreas. 

 

“A pesquisa é uma forma de você se aprofundar nos seus interesses, mas de uma maneira mais organizada e mais consistente [...] É uma forma de você aprender a falar sobre algo que você gosta”.

Stella de Souza Bolina, estudante de audiovisual

 

Stella enfatiza também a convivência com a orientadora, professora Cecilia Antakly de Mello, do Departamento de Cinema, Rádio e Televisão (CTR). “Eu achei muito importante esse processo de ‘fazer em conjunto com o seu orientador’, de ter essa troca, de ter essa pessoa a quem responder”. Após a etapa teórica de pesquisa, Stella está fazendo a análise filmica, que incluirá agora, além da obra de Coutinho, a diretora vietnamita Trinh T. Minh-ha: “Eu acho que o processo de pesquisa é você ir aprendendo a lidar com uma dúvida sua e ir aprendendo a estudá-la”, conta Stela. "É um compromisso muito grande, porque é mais que um curso eu diria, porque é uma responsabilidade sua. Você é que está ali direcionando. É um desejo seu”.

Stella Bolina, durante apresentação de seu trabalho na primeira etapa do SIICUSP. Imagem: Reprodução/Youtube

 

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