CRP | Departamento de Relações Públicas, Propaganda e Turismo



Estilista indígena aprende e traz contribuições para MBA em Negócios e Estética da Moda

Sioduhi Piratapuya trabalha com referências que resgatam conhecimentos ancestrais e reflete sobre a descentralização da moda no Brasil

Comunidade

Foto de Sioduhi sentado e segurando um tecido molhado que tem uma parte mergulhada em um recipiente de vidro. O homem está sem camisa, veste uma calça branca e tem algumas tiras de tecido em volta de seu braço esquerdo. Ele está de lado e não é possível ver seu rosto. Seus braços estão bem esticados em direção ao recipiente, que contém um líquido escuro e está apoiado em um pedaço de madeira. Em primeiro plano, bastante desfocadas, estão algumas mandiocas.
Imagem: Alexandre Cruz-Noronha/Sumaúma

Sioduhi Piratapuya, estudante do curso de MBA em Negócios e Estética da Moda da ECA, é de um território indígena do Alto Rio Negro, que fica no município de São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas. O estilista desenvolveu um corante de tecido à base de mandioca e busca resgatar  outras tecnologias dos povos originários em seu trabalho na Sioduhi Studio, empresa da qual é fundador e diretor criativo. 

MBA em Negócios e Estética da Moda

Desde que foi lançado, em março de 2022, o curso de MBA em Negócios e Estética da Moda tem capacitado profissionais para idealizar e implementar estratégias de marketing e comunicação na indústria da moda. O MBA é um curso de pós-graduação lato sensu, ou seja, é voltado para quem já concluiu outra graduação e quer se atualizar, se especializar ou se diferenciar no mercado de trabalho.

A professora Clotilde Perez, coordenadora do curso, explica que a grade curricular foi pensada para acompanhar as inovações do setor. “Idealizamos um conjunto de horas intitulado Tendências de Moda, que abriga temas, profissionais e pesquisas que estejam relacionados a projetos disruptivos”, relata. O curso é totalmente online e reúne pessoas de todo Brasil, o que fomenta reflexões para repensar a moda

 

Estética e negócios. Teoria e prática.

Já formado em administração e pós-graduado em gerenciamento de projetos, Sioduhi queria se especializar ainda mais no setor de moda. Após pesquisar diversos cursos, optou pelo MBA da ECA pela qualificação dos professores, pela composição da grade curricular e pela praticidade do modelo totalmente remoto

O curso da ECA tem superado as expectativas do estilista: as aulas têm ajudado a agregar o conhecimento teórico à experiência prática profissional. “É legal para pensar como posso criar estratégias melhores, entender onde consigo alocar melhor minhas forças e conhecer quais são meus pontos fortes e fracos”, avalia.

Ele acrescenta que, a partir dos estudos, é possível observar a cadeia produtiva de fora e passar a ter uma compreensão que muitas vezes não é óbvia. “Nós tivemos aulas com informações concretas de pesquisas, por exemplo. Entendemos, em nível nacional, como estão funcionando a plantação, a fiação, a produção de tecido, tudo até a peça final no varejo”, conta. 

Dentre as disciplinas que Sioduhi mais gostou, está Styling e Produção de Moda. O estilista conta que estava desenvolvendo um editorial, ensaio fotográfico que apresenta o conceito de uma coleção de roupas, para sua marca na mesma época em que cursava essa matéria. Por isso, foi a oportunidade perfeita para colocar os ensinamentos em prática

Outras disciplinas importantes são aquelas voltadas a planejamento estratégico, gestão financeira das empresas, análise do mercado e produção criativa. A professora Clotilde esclarece que estudar a relação da estética com os negócios é fundamental, pois essa é a base da moda. “[A moda] precisa ser bela, não no sentido da perfeição, mas do admirável, mas também precisa vender e remunerar toda a cadeia”.

Mais do que um espaço de troca e aprendizado, as aulas têm sido um espaço de questionamentos. Para Sioduhi, faltam críticas, ideias diferentes e novas perspectivas, tanto na academia quanto no mercado do setor. Por isso, a possibilidade de criar novos ciclos sociais e de “juntar cabeças pensantes” é, para o estudante, o que torna o curso tão vivo e dinâmico.

 

 

Descentralizar a moda

Enquanto alguns lugares têm as quatro estações mais definidas, a região Norte é quente e úmida durante o ano todo. “Pensar a forma de criar moda aqui é muito diferente do que pensar no Sudeste, no Sul, e mesmo no Nordeste. Nem todas as roupas que eu crio para o Sudeste vão funcionar no Norte”, explica o estilista. Considerar a diferença entre os climas de cada região do país é só um exemplo do que Sioduhi chama de descentralização da moda. 

Por ser o único estudante indígena em uma turma com mais de 100 pessoas, Sioduhi sente grande responsabilidade de trazer para a sala de aula questionamentos e referências que fogem do que os colegas estão acostumados. “Dificilmente há pessoas da região Norte, e isso é do cenário da moda no Brasil. No Sudeste é onde está mais concentrado, tem mais oportunidades. Mas eu tenho trazido muito a discussão sobre descentralização no curso, isso é muito importante”, afirma.

Foto de Sioduhi segurando à sua frente uma camiseta de cor cinza. Ele tem pele morena clara, cabelos lisos na altura dos ombros e olha para a câmera. Ao fundo uma parede em tom alaranjado. O texto na camiseta é “A coleção manioqueen apresenta a estampa Hãu Porã (filhotes de beijú), destacando um dos beijus de mandioca do alto do rio Negro. Intercruzando a cobra canoa, a criação do universo e as manivas do Ba’asebó (criador dos alimentos). Juntos compõem um grafismo impresso de ancestralidade, manifestando uma voz indígena futurista.”
Imagem: Reprodução/Instagram @sioduhistudio

Falta a voz dos povos originários na academia, reflete o estilista. Para tentar preencher essa lacuna, ele compartilha suas experiências e indica bibliografias, projetos e pesquisas. O aluno contou, em entrevista ao Sustexmoda, que os docentes do MBA são muito abertos a discutir e questionar, o que acaba estimulando os outros estudantes a pensar fora do óbvio, além da moda europeia, e a olhar mais para dentro do nosso próprio país

Por enquanto, Sioduhi prefere focar sua atenção no curso e na aplicabilidade da profissão. Embora não descarte a possibilidade de entrar numa pós-graduação stricto sensu (mestrado e doutorado) no futuro, o diretor criativo da Sioduhi Studio pretende continuar dedicado aos seus projetos e à sua pesquisa independente.

 

 


Imagem de capa: Alexandre Cruz-Noronha/Sumaúma