Como a comunicação pode combater conflitos na escola?

Livro originado em tese da ECA investiga o uso da comunicação na resolução de pequenas violências entre estudantes do Ensino Médio

Vida acadêmica

A jornalista e pesquisadora Patrícia Guimarães Gil publicou recentemente o livro Tamo Junto:  o argumento estudantil e sua gramática em uma arena de conflitos, baseado em sua tese de doutorado homônima, defendida junto ao Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação (PPGCOM) da ECA. O lançamento ocorreu em junho de 2021 pela editora Appris e a obra apresenta uma análise sobre o poder de argumentação entre alunos e alunas adolescentes de uma escola pública de ensino integral, em São Paulo.

A pesquisa tomou como ponto de partida conflitos ocorridos no contexto do movimento político de ocupação das escolas, em 2015, que teve casos de depredação do patrimônio escolar e brigas violentas entre estudantes em meio aos protestos contra a reordenação da rede estadual de ensino. A Escola Estadual Alberto Torres foi eleita para o estudo de caso, com a realização de 14 debates envolvendo 94 alunos do ensino médio. 

O método utilizado propõe um um olhar comunicacional para os relacionamentos no interior da instituição de ensino, com foco na gramática estudantil de ação e conversação, além da argumentação em temas polêmicos, do cotidiano, traumas e violências sofridas no próprio contexto escolar.  Chamada de mediação transformativa, a metodologia se vale de técnicas de condução dos debates com a finalidade de facilitar o diálogo entre as partes, levando sempre em consideração a autoafirmação dos sujeitos e o reconhecimento de seus interlocutores.

Para Patrícia, esse modelo foi fundamental para identificar o fortalecimento da participação dos estudantes em uma discussão política e cívica de maneira adequada, com respeito e construção de opiniões, além de apontar possibilidades para o aprimoramento de ações coletivas. “Uma hipótese, que caberá a futuras pesquisas desvendarem, é a de que práticas comunicativas como debates colaboram para a relação simbiótica entre o desenvolvimento de uma pessoa melhor resolvida em sua identidade e a mobilização a favor das dimensões coletivas. E, no meio do caminho, à medida que os valores são repensados, os interesses são negociados e as capacidades comunicativas são aprimoradas, as relações no espaço escolar podem (quiçá) se equilibrar”, diz. 

Patrícia Guimarães Gil é uma mulher jovem, de cabelos loiros na altura dos ombros e óculos de armação grande e escura. Ela usa uma blusa estampada em tons de marrom e segura seu livro Tamo Junto: oargumento estudantil e sua gramática em uma arena de conflitos enquanto sorri sutilmente para a câmera.
Patrícia Guimarães Gil e o livro Tamo Junto:  o argumento estudantil e sua gramática em uma arena de conflitos. Foto: Reprodução/YouTube

"Os debates evidenciam a subjetividade na expressão e na manifestação dos jovens durante as discussões e, com a acolhida dos colegas, formam-se correntes discursivas - uma gramática especial de argumentação, que se caracteriza pelo reforço de vínculos de cooperação para o enfrentamento de conflitos”. Patrícia destaca que, se a comunicação pode ter papel estruturante na produção do conflito, é também a ela que se deve recorrer para buscar uma nova linguagem, que seja capaz de promover laços em vez de rupturas.

As discussões mediadas são oportunidades de encontros, de formação e de negociação entre todos e, segundo a pesquisadora, permitem vislumbrar novas pesquisas e encaminhamentos comunicacionais na escola. “Tais recursos podem vir a ser usados para enfrentar os conflitos que amargam a convivência escolar, ou para intensificar relações de respeito e estima em seu interior, mas só fazem sentido se estiverem a favor dos estudantes”, afirma.

Patrícia ainda ressalta que o conjunto de reflexões e propostas de práticas no espaço escolar deve sempre ter como cerne a ideia da escola como uma arena de comunicação pública, "que oferece a chance de juntar e incluir as alteridades" em um diálogo amplo, onde todos se encontram e desejam se sentir reconhecidos. “No interior da escola ou a partir dela, é possível promover engajamento conversacional cívico, em que um de ‘nós’ torna-se uma possibilidade de acolhimento. Não precisamos ser iguais para argumentar e para nos enredarmos a favor do que é justo. Só precisamos estar juntos”, finaliza.

Confira o livro Tamo Junto:  o argumento estudantil e sua gramática em uma arena de conflitos, disponível na versão impressa.