CTR | Departamento de Cinema, Rádio e Televisão



Primeiro longa de diretora ecana aborda transtorno alimentar na adolescência

Diário de Viagem, dirigido por Paula Kim, tem como protagonista Manoela Aliperti, de Malhação e As Five 

Vida acadêmica
Imagem de perfil de uma garota com cabelo liso e franja ao centro. Abaixo o título do filme em letras maíusculas em tons de rosa, com fundo branco
Cartaz do longa de Paula Kim. Imagem: Divulgação/ Pandora Filmes

Está em cartaz no circuito comercial, com distribuição da Pandora Filmes, o primeiro longa-metragem de Paula Kim, Diário de Viagem (2021). Formada no Curso Superior do Audiovisual do Departamento de Cinema, Rádio e Televisão (CTR) da ECA nos anos 2000, Paula parte de uma experiência pessoal para abordar os conflitos na vida de Liz, uma adolescente interpretada por Manoela Aliperti , que desenvolve um transtorno alimentar após um intercâmbio mal-sucedido na Irlanda em 1995.

Filmada em 2019, a obra é fruto de 12 anos de esforço pessoal para conseguir captação e tirá-la do papel. "Lembro de questionar, quando nova, como estudante da ECA, porque os professores demoram tanto para lançar o primeiro filme... E cá estou eu, próxima de fazer 40 anos (risos)", diz Paula ao rememorar o início de seu percurso no audiovisual.

Antes de realizar o longa, Paula criou uma página na internet no início da década passada, o Sobre Nossa Visão Distorcida. Foi a forma dela tentar entender esse período difícil de sua vida, compartilhando sua experiência e obtendo feedback de especialistas e outras meninas e mulheres.  As trocas geradas pela página contribuíram para a construção do roteiro, que tem inspiração na sua vida mas também nas de outras mulheres que passaram por esse transtorno na adolescência. 

 

"Eu quis fazer o Diário com muito cuidado e sempre busquei que ele fosse um filme com uma mensagem acessível, pois a minha intenção é trazer a questão desta personagem à tona e ser respeitosa com a temática e com todas as pessoas envolvidas nestes 12 anos que expuseram suas histórias pessoais e familiares para mim"

Paula Kim, ex-aluna de Audiovisual

 

Profissão cineasta: un long chemin
 
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Manoela Aliperti dá vida à Liz em Diário de Viagem. Imagem: Divulgação/Sam Ka Pur Filmes. 

Em conversa com o Laboratório Agência de Comunicação (LAC) da ECA, a diretora lembrou dos tempos de graduação, falou sobre o processo de realização do filme, a experiência de ter sido a primeira brasileira a participar do Atelier da Cinéfondation – que integra o prestigiado Festival de  Cannes e seleciona projetos de longa-metragem em desenvolvimento –, a escolha de Manoela Aliperti como protagonista e novos projetos. 

 

Não fosse o convite para integrar o Atelier da Cinéfondation, em 2015, você acha que teria conseguido finalizar o longa? Como a experiência no Cinéfondation contribuiu para o desenvolvimento do roteiro e para a viabilização financeira do projeto?
 

Não tenho como saber se este seria meu primeiro filme, mas sem dúvida por causa da entrevista para a residência, na verdade, em 2010, que eu coloquei o Diário de Viagem como primeiro da fila. Eu entrei neste mundo de editais com dois roteiros (..). Priorizei o Diário, apesar de ser um filme mais difícil de produzir e mais caro. Mas eu acho que não teria sozinha acreditado como o Cinéfondation acreditou na minha capacidade e na relevância do que eu queria dizer. E isso aconteceu na residência (do Cinéfondation do Festival de Cannes), em 2010, onde eu não passei na entrevista, mas me convidaram para Paris e falaram comigo sobre o projeto, com o Gilles Jacob [crítico, cineasta e diretor do Festival de Cannes] presente. Ele ter me oferecido as mãos para um aperto e falado que leu meu argumento mexeu comigo. Achei que tudo era possível (risos). Depois o L'Atelier foi incrível, mas o projeto já estava pronto, em captação. Para ser bem honesta, depois que retornei ao Brasil, foi muito difícil ganhar editais. Eu fui convidada para Cannes em 2015 com o Diário para o L'Atelier, e não ganhei nenhum (!) edital naquele ano, só um ano e meio depois. O Cinéfondation não contribuiu assim, diretamente e rapidamente, para a captação, mas para um projeto e uma iniciante que eram completamente desconhecidos, deu um selo e uma experiência, respectivamente. Na verdade, foi muito mais para as pessoas não tão dentro do audiovisual do que para a indústria em si que deu visibilidade, foi essa a minha impressão. 

 

A Manoela Aliperti é conhecida do grande público por seu trabalho em Malhação: Viva a Diferença (temporada 2017), e em As Five (2020-presente). Esse trabalho serviu de inspiração para tê-la contratado?
 

Eu nunca consegui assistir a um episódio inteiro de Malhação porque desde que a Manu estreou em Malhação eu já estava em um esquema muito Diário de Viagem e ela ainda não estava no projeto. O que me atraiu foi o teste dela. Eu não estava acompanhando a televisão naquele momento. Então, quando ela passou pelo teste e eu gostei, busquei cenas no youtube e também gostei, mas eu não consegui acompanhar, por falta de tempo mesmo.

 

O filme é inspirado numa vivência pessoal sua. Quando você decidiu levar à tela um  problema vivido nos anos 1990? E qual o maior desafio em lidar com uma obra ficcional a partir de uma experiência pessoal?
 
Duas garotas estão num avião. Ambas vestem camisas de intercâmbio (uma branca, outra cinza). A garota, de cabelo liso e pele branca, à esquerda oferece um chocolate a outra, morena, que levemente sorri, como quem agradece o oferecimento.
Após voltar de intercâmbio na Irlanda, Liz (Manoela Aliperti) passa a desenvolver transtorno alimentar. Imagem: Divulgação/ Sam Ka Pur Filmes.

Decidi em 2010, depois que retornei da minha pós na Coréia do Sul. Tinha alguns argumentos de longa que estava enviando para editais de desenvolvimento e programas de incentivo, e foi aí que a residência do Cinéfondation do Festival de  Cannes me chamou para a entrevista em Paris com o argumento deste projeto. Foi então que eu botei na cabeça que aquele argumento inicial tinha porque tinha que virar um filme. Naturalmente, os anos 90 foram se formando porque era mais fácil para mim imaginar uma adolescência nesta época, que foi a minha época. E a questão do Diário para mim era muito importante. Muito.

 

Como foi sua experiência enquanto aluna de graduação na ECA?
 

Eu era disciplinada e ocupada. Como morava longe, ficava o dia inteiro inventando atividades para fazer o dia render, pois perdia quase quatro horas por dia no transporte público. Não gostava de atrasos, porque tinha que me programar muito para chegar na ECA no horário. (...) E programava também para ter coisas para ler e/ou escutar no ônibus, algo que desse para fazer em pé também porque o ônibus costumava ser cheio. Não tinha a linha amarela (do metrô), o trânsito era muito difícil!

 

Novos projetos
 

Na esteira da onda cultural sul-coreana popular entre os jovens do Brasil e do mundo, Paula também assina Além do Guarda Roupa, primeiro K-drama filmado no Brasil e que conta com a participação de estrelas do k-pop, como Kim Woojin, Jin Kwon, Lee Min Wook e Jae Chan

Quatro rapazes de origem asiática chamam o leitor com a mão. Todos usam trajes coloridos (azul, branco, amarelo e rosa) e um (ao centro) possui cabelo totalmente descolorido.
Jae Chan, Jin Kwon, Woojin e Min Wook: estrelas do k-pop internacional que participam da série Além do Guarda Roupa, de Paula Kim. Foto: Divulgação/ HBO Max. 

Ambientado no bairro do Bom Retiro, reduto dos coreanos em São Paulo, a trama  gira em torno de Carol (interpretada por Sharon Blanche), uma jovem de origem coreana que tem aversão a tudo que é relativo ao país de seu pai até o momento em que descobre que seu guarda-roupas serve como um portal mágico para o dormitório do ACT, o maior grupo de k-pop do mundo. A série está prevista para estrear ano que vem no HBOMax: "Eu tive muita sorte de estar no lugar certo e na hora certa para fazer este projeto", diz a realizadora, que tem ascendência sul-coreana e fez mestrado na Korea National University of Arts, em Seul. 

Além de Paula, o projeto também tem a participação de outros ecanos, como o professor do CTR Roberto Moreira e a egressa do antigo curso de Cinema e Vídeo Geórgia Costa Araújo, ambos da produtora Coração de Selva. "É uma série leve, linda, maravilhosa, e com mensagens relevantes para o público jovem. A grande sorte que tive nessas minhas estreias foi poder dirigir obras para o público jovem. É uma ótima energia.”